Lyrics and translation Gabriel o Pensador - O Resto do Mundo

O Resto do Mundo

Eu queria morar numa favela
Eu queria morar numa favela
Eu queria morar numa favela
O meu sonho é morar numa favela

Eu me chamo de cheiroso como alguém me chamou
Mas pode me chamar do que quiser, Seu Doutor
Eu não tenho nome, eu não tenho identidade
Eu não tenho nem certeza se eu sou gente de verdade
Eu não tenho nada, mas gostaria de ter
Aproveita, Seu Doutor, e dá um trocado pra eu comer

Que trocado o quê, tem vergonha nessa cara suja, não?
Vai trabalhar, ô vagabundo!

Eu gostaria de ter um pingo de orgulho
Mas isso é impossível pra quem come o entulho
Misturado com os ratos e com as baratas
E com o papel higiênico usado, nas latas de lixo
Eu vivo como um bicho ou pior que isso

Eu sou o resto, o resto do mundo
Eu sou mendigo, um indigente
Um indigesto, um vagabundo
Eu sou... Eu num sou ninguém

Eu tô com fome, tenho que me alimentar
Eu posso não ter nome, mas o estômago tá lá
Por isso eu tenho que ser cara de pau
Ou eu peço dinheiro ou fico aqui passando mal
Tenho que me rebaixar a esse ponto
Porque a necessidade é maior do que a moral

Eu sou sujo, eu sou feio, eu sou antissocial
Eu não posso aparecer na foto do cartão postal
Porque pro rico e pro turista eu sou poluição
Sei que sou um brasileiro, mas eu não sou cidadão

Eu não tenho dignidade ou um teto pra morar
E o meu banheiro é a rua e sem papel pra me limpar
Honra? Não tenho, eu já nasci sem ela
E o meu sonho é morar numa favela

Eu queria morar numa favela
Eu queria morar numa favela
Eu queria morar numa favela
O meu sonho é morar numa favela

A minha vida é um pesadelo e eu não consigo acordar
Eu não tenho perspectivas de sair do lugar
A minha sina é suportar viver abaixo do chão
E ser um resto solitário esquecido na multidão

Eu sou o resto do mundo
Eu sou um mendigo, um indigente
Um indigesto, um vagabundo
Eu sou o resto do mundo
Eu não sou ninguém, eu não sou nada
Eu não sou gente

Eu sou o resto do mundo
Eu sou um mendigo, um indigente
Um indigesto, um vagabundo
Eu sou o resto
Eu não sou ninguém

Frustração, é o resumo do meu ser
Eu sou filho da miséria e o meu castigo é viver
Eu vejo gente nascendo com a vida ganha
E eu não tenho uma chance
Deus, me diga por quê?

Eu sei que a maioria do Brasil é pobre
Mas eu não chego a ser pobre, eu sou podre!
Um fracassado, mas não fui eu que fracassei
Porque eu não pude tentar, então que culpa eu terei

Quando eu me revoltar, quebrar, queimar, matar
Não tenho nada a perder, meu dia vai chegar
Será que vai chegar?
Mas por enquanto eu sou o resto

O resto do mundo
Eu sou um mendigo, um indigente
Um indigesto, um vagabundo
Eu sou o resto do mundo
Eu não sou ninguém, eu não sou nada
Eu não sou gente

Eu sou o resto do mundo
Eu sou um mendigo, um indigente
Um indigesto, um vagabundo
Eu sou o resto do mundo
Eu não sou ninguém

Eu não sou registrado, eu não sou batizado
Eu não sou civilizado, eu não sou filho do Senhor
Eu não sou computado, eu não sou consultado
Eu não sou vacinado, contribuinte eu não sou

Eu não sou comemorado, eu não sou considerado
Eu não sou empregado, eu não sou consumidor
Eu não sou amado, eu não sou respeitado
Eu não sou perdoado e também sou pecador

Eu não sou representado por ninguém
Eu não sou apresentado pra ninguém
Eu não sou convidado de ninguém
Eu não posso ser visitado por ninguém

Além da minha triste sobrevivência
Eu tento entender a razão da minha existência
Por que que eu nasci? Por que tô aqui?
Um penetra no inferno sem lugar pra fugir

Vivo na solidão, mas não tenho privacidade
Não conheço a sensação de ter um lar de verdade
Eu sei que eu não tenho ninguém pra dividir um barraco comigo
Mas eu queria morar numa favela, amigo

Eu queria morar numa favela
Eu queria morar numa favela
Eu queria morar numa favela
O meu sonho é morar numa favela

The Rest of the World

I wish I lived in a favela
I wish I lived in a favela
I wish I lived in a favela
My dream is to live in a favela

I call myself "smelly" like someone called me
But you can call me whatever you want, Doctor
I don't have a name, I don't have an identity
I'm not even sure if I'm a real person
I have nothing, but I would like to have
Take advantage, Doctor, and give me some spare change to eat

Spare change what? Aren't you ashamed with that dirty face?
Go to work, you bum!

I would like to have a little bit of pride
But that's impossible for someone who eats garbage
Mixed with rats and cockroaches
And with used toilet paper, in garbage cans
I live like an animal or worse than that

I am the rest, the rest of the world
I am a beggar, a destitute
An indigestible, a vagrant
I am... I am nobody

I'm hungry, I have to eat
I may not have a name, but the stomach is there
That's why I have to be shameless
Either I ask for money or I'm here feeling sick
I have to lower myself to this point
Because the need is greater than morals

I am dirty, I am ugly, I am antisocial
I can't appear in the postcard picture
Because for the rich and the tourist I am pollution
I know I am Brazilian, but I am not a citizen

I don't have dignity or a roof over my head
And my bathroom is the street and without paper to clean myself
Honor? I don't have it, I was born without it
And my dream is to live in a favela

I wish I lived in a favela
I wish I lived in a favela
I wish I lived in a favela
My dream is to live in a favela

My life is a nightmare and I can't wake up
I have no prospects of getting out of this place
My fate is to endure living below the ground
And be a lonely remnant forgotten in the crowd

I am the rest of the world
I am a beggar, a destitute
An indigestible, a vagrant
I am the rest of the world
I am nobody, I am nothing
I am not a person

I am the rest of the world
I am a beggar, a destitute
An indigestible, a vagrant
I am the rest
I am nobody

Frustration is the summary of my being
I am the son of misery and my punishment is to live
I see people being born with life already won
And I don't stand a chance
God, tell me why?

I know that the majority of Brazil is poor
But I'm not even poor, I'm rotten!
A failure, but it wasn't me who failed
Because I couldn't try, so what fault would I have

When I revolt, break, burn, kill
I have nothing to lose, my day will come
Will it come?
But for now I am the rest

The rest of the world
I am a beggar, a destitute
An indigestible, a vagrant
I am the rest of the world
I am nobody, I am nothing
I am not a person

I am the rest of the world
I am a beggar, a destitute
An indigestible, a vagrant
I am the rest of the world
I am nobody

I am not registered, I am not baptized
I am not civilized, I am not a child of the Lord
I am not computed, I am not consulted
I am not vaccinated, a taxpayer I am not

I am not celebrated, I am not considered
I am not employed, I am not a consumer
I am not loved, I am not respected
I am not forgiven and I am also a sinner

I am not represented by anyone
I am not introduced to anyone
I am not anyone's guest
I cannot be visited by anyone

Beyond my sad survival
I try to understand the reason for my existence
Why was I born? Why am I here?
An intruder in hell with no place to run

I live in solitude, but I have no privacy
I don't know the feeling of having a real home
I know I have no one to share a shack with me
But I wish I lived in a favela, my friend

I wish I lived in a favela
I wish I lived in a favela
I wish I lived in a favela
My dream is to live in a favela